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Entre Pequim, Moscou e Washington: Lula e o pragmatismo da política externa

Um diagnóstico sobre as movimentações do Governo Lula com sua política externa.

Última atualização em 20/02/2024
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Em abril, o presidente Lula adotou medidas de política externa que repercutiram na mídia internacional. Resgatando a tradição diplomática de seus primeiros dois mandatos, o mandatário fez movimentos no sentido de consolidar o Brasil enquanto um agente defensor dos países do Hemisfério Sul e promotor da paz global, embora tenha gerado atrito com os países desenvolvidos do Hemisfério Norte.

Primeira parada: China

Suas ações começaram com uma visita oficial à China, antagonista dos Estados Unidos no cenário global. No país de Xi Jinping, Lula participou da posse da ex-presidente Dilma Rousseff na presidência do Banco dos Brics - bloco econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. A relevância da visita é proporcional à importância do bloco, que reúne 40% da população mundial e um quarto do PIB do planeta, cerca de 25 trilhões de dólares.

Em um de seus discursos, Lula mencionou a possibilidade de os países do bloco deixarem de usar o dólar em suas transações comerciais, o que evitaria os custos de conversão de valores e significaria um distanciamento dos Estados Unidos.

Mas nem só de promessas foi a visita. Lula e Xi Jinping assinaram 15 acordos que fomentam a cooperação entre os dois países em áreas como comércio e indústria, comunicação, inovação, pesquisa e tecnologia. Na área comercial, foi criado um grupo de trabalho que buscará promover a troca de informações e medidas de facilitação de comércio com o objetivo de agilizar a circulação, a liberação e o despacho aduaneiro de mercadorias. 

Este acordo se torna ainda mais relevante na medida em que a Shein, uma gigante chinesa, procurou o ministério da Economia brasileiro para informar a respeito de seus planos de investir R$ 750 milhões para a produção no Brasil e gerar, assim, 100 mil empregos.

De Vargas a Lula: o pragmatismo em tempos de polarização

Nos anos 1930 e 1940, o então presidente Getulio Vargas adotou uma política de barganha nas relações com a Alemanha e os Estados Unidos, em um contexto de acirrada rivalidade entre os dois países, a qual acabou por gerar a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Naquele contexto, Vargas conseguiu o apoio de Washington para a construção da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), ainda que tenha desagradado o governo alemão e, posteriormente, significado o ingresso do Brasil no conflito mundial. A longo prazo, pode-se dizer que a política externa pragmática de Vargas foi benéfica, pois possibilitou o desenvolvimento da indústria de base no Brasil.

De forma semelhante ao ex-presidente, Lula fez uso do pragmatismo para barganhar com os dois grandes blocos em antagonismo neste início de século XXI: Estados Unidos e OTAN, por um lado, China e Rússia, por outro. Ambos grupos têm tido posições divergentes a respeito do conflito na Ucrânia.

Após ter visitado a China, Lula criticou a postura dos Estados Unidos e da Europa no conflito entre Rússia e Ucrânia. Segundo o petista, aqueles países estariam contribuindo para a continuação da guerra e a inviabilidade da paz. Além disso, Lula manifestou certo respaldo às reivindicações russas ao território da Criméia, o que desagradou o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. O auge do desconforto internacional veio com a visita do ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, ao Brasil. 

Frente a esta aproximação entre Brasília, Pequim e Moscou, o governo Joe Biden reagiu fazendo um agrado ao governo brasileiro: pediu ao Congresso do país a aprovação de US$ 500 milhões (R$ 2.5 bilhões) para o Fundo Amazônia. O novo valor quintuplica o valor anunciado inicialmente por Washington, o qual frustrou o governo brasileiro. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que este novo valor contribuiria para o aumento da fiscalização e da prevenção ao desmatamento na Amazônia.

Qual é o risco?

No curto prazo, Lula parece ter obtido uma concessão de Washington para evitar um alinhamento brasileiro com os governos de Pequim e Moscou. No entanto, esta política tem seus riscos. O primeiro é prejudicar a tradicional política externa de neutralidade e busca pela resolução pacífica de conflitos da diplomacia brasileira. O segundo são as possíveis punições a esta política externa, uma vez que Estados Unidos e Europa dispõem de instrumentos econômicos e geopolíticos capazes de inviabilizar investimentos ou barrar acordos comerciais, como o do Mercosul com a União Europeia. Uma punição desse tipo teria um tremendo impacto no capital político do presidente, que vem tentando recolocar o Brasil no cenário geopolítico global. 

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